Por Breno Bizinoto – Revista Ciclo Sul

 

Para decidirmos o que realmente é importante na compra de uma bicicleta, precisamos nos ater primeiro à bicicleta em si, para depois observar os componentes e acessórios que equipam o conjunto.

E quando falamos sobre a bicicleta em si, temos o foco principal no quadro dela. Analisar a geometria e seu material de construção é de suma importância para termos o resultado de como aquela bike vai se comportar em trilhas, asfalto, subidas, descidas, o quanto ela será veloz, segura e confortável.

Anteriormente falamos sobre o ângulo de caixa de direção e o quanto uma bicicleta pode se transformar com essa “simples medida”.

Hoje vamos falar sobre um parâmetro um pouco mais complexo, que é o Chainstay.

A tradução ao pé da letra seria “tubo da corrente”, mas dizemos ‘tubo inferior traseiro’.

O Chainstay é a medida que vai do eixo da roda traseira até o eixo do pedivela da bicicleta.

 

 

Como o próprio nome já diz, este é o tubo da corrente, logo podemos perceber que ele é abraçado pela parte mais complexa da bicicleta, que é a relação. Qualquer erro de medida ou posicionamento deste tubo pode ocasionar um problema crônico de desalinhamento da coroa, cassete e corrente. O alinhamento destas peças é conhecido pelo termo “chainline”. Um Chainline incorreto faz com que as marchas da bicicleta fiquem totalmente desreguladas.

Mas o mais importante para escolher uma bicicleta, dentro das várias modalidades existentes, é o tamanho do chainstay, pois ele tem atuação primordial em como a bicicleta vai se comportar durante a pilotagem.

O grande segredo dessa medida é que, quanto mais curta ela for, mais a roda traseira estará posicionada “dentro” da bicicleta. Desta forma, com um chainstay curto a roda traseira ficará bem próxima do piloto, concordam?

Por outro lado, um chainstay longo terá tubos mais propensos a torção, que reduzem a vibração e micro-impactos. E a roda traseira ficará posicionada mais longe do ciclista e da bicicleta, aumentando inclusive uma outra distância muito importante, que é o “entre-eixos” da bicicleta.

 

Observem que na imagem de cima temos uma bike de performance, com chainstay curto, inclusive com um notável recuo do seat-tube (tubo que encaixa o canote do selim), para haver a possibilidade de trazer a roda traseira em medida mais próxima do conjunto.

Na imagem de baixo, uma bike urbana, com a roda traseira um pouco mais afastada da bicicleta e um chainstay um pouco mais alongado.

É possível observar como o triângulo traseiro da primeira bicicleta é menor do que o da segunda.

A primeira bicicleta, com o chainstay mais curto, terá uma ótima performance em curvas fechadas, pois o piloto posicionado “em cima da roda traseira” faz com que o eixo de rotação em curva seja bem curto. É a mesma diferença de um carro esportivo e uma caminhonete tentando fazer uma curva. O carro esportivo vai ter mais agilidade, pelo mesmo motivo de ter a traseira encurtada, enquanto a caminhonete tem traseira alongada, entendem?

Ainda sobre a primeira bicicleta, ela vai ter mais rigidez. Isso é bom para os momentos que o piloto faz um sprint ou encara uma subida longa, mas deixa a bicicleta menos confortável para atravessar uma estrada com o asfalto ruim (quando comparando bikes de asfalto).

Já a segunda bike, com um chainstay mais longo, vai ser uma bike com menos agilidade, assim como a caminhonete quando comparada com o carro esportivo.

A configuração de um chainstay longo é bem recomendada para passeios longos de gravel e bikes urbanas, onde o conforto vem em primeiro lugar, sem a necessidade de arrancadas super ágeis com um equipamento arisco.

Vamos comparar algumas bikes de diversas modalides e as suas medidas de Chainstay:

 

Neurogen – Chainstay 405 mm

Esse é o chainstay mais reduzido da linha Swift. A Neurogen tem a traseira tão curta que necessita de um seat tube totalmente curvado para caber a roda traseira praticamente dentro da bike. Arrancadas rápidas, rigidez, alta velocidade e agilidade são prioridades dessa configuração. Conforto e absorção de impactos não é a palavra chave deste projeto, uma vez que é desenhada para terrenos planos e provas de Triathlon e Contra-relógio. Em outras palavras: ótima bike para um asfalto plano e lisinho, mas péssima para passar em um setor de paralelepípedos.

 

Racevox – Chainstay 410 mm

 

Com um chainstay muito curto, essa é a road performance da linha. Seu seat tube tem uma leve curva para caber a roda traseira encaixada no conjunto, mas sem a mesma ênfase da Neurogen. Esta ainda é uma bike muito arisca, com arrancadas rápidas, boa em curvas e muito rígida. Não é feita para terrenos ruins como gravel, mas sobe muito bem e, com certo desconforto, pode passar por asfaltos de qualidade ruim.

 

Ultravox – Chainstay 408 a 412 mm (a depender do tamanho)

A Ultravox é uma bike que tem o chainstay basicamente parecido com a da sua irmã Racevox, mas as medidas variam de acordo com os quatro tamanhos de quadro disponíveis. De qualquer forma, é uma bike um pouco menos agressiva e arisca.

 

Univox – Chainstay 419 mm

Aqui temos uma medida de chainstay que começa a ser considerada como grande para uma bike puramente de asfalto. É por isso que a Univox vem com outras medidas superdimensionadas, como ângulo da caixa de direção e clearance dos pneus, o que faz dela uma bicicleta perfeita para o gravel. Este conjunto de medidas, juntas com o chainstay de 419 mm, faz com que seja uma bicicleta confortável, que absorve micro impactos e te permite pedalar mais longe e por mais tempo.

O chainstay maior também torna mais fácil de se utilizar bagageiros traseiros na bicicleta, sem que eles fiquem raspando no pé do piloto.

Obviamente, essa bike terá menos agressividade em arrancadas e suas curvas não serão tão fechadas quanto das primeiras bikes que mostramos

 

Sense Invictus – Chainstay 438 mm

Vamos às MTBs. A Invictus é a MTB full suspension para XCO e XCM da Sense. A marca escolheu uma medida de chainstay, que não é a menor do mercado, mas está entre as menores. Isso quer dizer que, dentro da modalidade elegida (XC full suspension) essa bike aborda um meio termo para estar entre as mais velozes, mas ainda com uma margem legal para ter conforto e segurança mínimos, afinal, uma MTB não pode ter todo o foco em agilidade e ficar com cara de contra-relógio, concordam? Vamos aos próximos modelos:

 

Impact Carbon – Chainstay 435 mm

A Impact também é desenhada para a mesma modalidade da Invictus, porém, não leva uma suspensão traseira. Isso permite que ela tenha mais espaço para encaixar a roda traseira um pouco mais próxima do conjunto, dando a ela uma das características mais marcantes de uma hardtail quando comparada com as full suspension: rigidez e agilidade. Estes 3mm a menos fazem sim bastante diferença e servem como ponto crucial na hora de os pilotos de XC escolherem entre uma full e uma rígida.

 

Rock Evo – Chainstay 445mm

Aqui a modalidade é o MTB recreativo. Não existe necessidade de uma bike arisca e que faz curva super radicais, mas sim de segurança e conforto. Por isso, o chainstay com 10 mm a mais do que a Impact muda completamente a condução da bike. Essa medida vai fazer com que essa bike tenha menos rigidez e mais absorção de impactos. Essa diferença entre as bikes nos mostra a importante a reflexão de que uma bike competitiva (e naturalmente mais cara) nas mãos de um amador, pode ser uma escolha ruim. Se o seu intuito é o MTB recreativo, analise bem as medidas da geometria da bike que você vai comprar!

 

Exalt – Chainstay 439mm

 

Aqui mudamos para o mundo do enduro. Essa é a bike trail full suspension da Sense. Ela não precisa de arrancadas da rápidas, mas se tiver é bom. Ela precisa de agilidade em curvas, por isso o chainstay curto é algo muito desejado, mas sempre desafiador para os engenheiros, pois precisam lidar com uma suspensão traseira que tem um curso de movimentação de aproximadamente 150 mm. Essa é uma das menores medidas do mercado, se comparada com o que outras marcas abordam para a mesma categoria de bicicletas. Logo, a Exalt é uma bike que tem uma desenvoltura muito boa em curvas e boa arrancada.

 

Hardcore – Chainstay 430 mm

Esse é um dos Chainstays mais curtos da categoria MTB aro 29. Como essa bike tem um ângulo de caixa de direção muito aberto e 150 mm de suspensão dianteira, mesmo sendo uma bike rígida ela tem performance incrível na modalidade trail/enduro.

Essa configuração de chainstay é o grande segredo da bicicleta, fazendo com que o piloto esteja praticamente em cima da roda traseira, com controle total da bicicleta. O “problema” de rigidez e impactos criados por um chainstay tão curto é resolvido em partes pelo uso de um canote retrátil e condução do piloto.

Essa bicicleta vai apresentar uma retomada de aceleração fantástica, incomparável com outras MTBs. Obviamente, perde em conforto quando comparada com uma full suspension que, naturalmente, possui o chainstay mais longo.

A proposta da Hardcore é justamente essa: agilidade total nas trilhas, passando por tudo.

 

HardPump – Chainstay 385

Por último, esse belíssimo lançamento para a modalidade pump track. É o chainstay mais curto que mencionamos aqui, mesmo se comparado com a Neurogen, feita para Triathlon e contra relógio.

Isso é possível por que essa bike utiliza aros 26, menores do que qualquer uma das bikes citadas aqui. O motivo de usar aro 26 não é para baratear o projeto ou por utilização de tendências passadas, mas por quê a modalidade Pump Track é a que mais precisa de agilidade, rigidez e boas arrancadas, afinal, a bicicleta precisa sair do chão e voar! O aro 26 entrega tudo isso!

Para conseguir uma medida mínima no chainstay dessa bicicleta, o seu projeto contemplou a substituição de tubos por peças metálicas maciças, deixando um espaço maior para a roda traseira, aumentando a resistência e claro, rigidez.

Essa peça que está atrás do pedivela é maciça e ocupa menos espaço do que tubos convencionais. Como a bike é muito rígida, as pancadas que ela recebe são muito fortes, então esse precisa ser um projeto muito resistente. Sua resistência é superdimensionada com essa peça maciça e com soldas também exageradas.

Entenderam como cada modalidade tem suas particularidades moldadas a partir das medidas de geometria? Entenderam que o conceito de uma marca não vem do pneu ou câmbio que a equipa, mas das medidas que ela decide abordar para cada uma das modalidades, tornando mais ou menos marcantes cada uma de suas características de pilotagem?

Este é ponto que precisamos aprender para discutir qual marca nos agrada mais, qual mais combina com o nosso estilo de pilotagem e qual delas escolheu o meio termo legal para a gente ter a pilotagem mais agradável.

Bons pedais a todos!

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